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Chegamos com o segundo D!MENTi News, que vem com a 16ª edição do nosso IC Encontro de Artes, festival multilinguagem realizado em Salvador desde 2006. A pergunta-chave da vez é: “Que monstra sou eu?”. De 21 a 24 de agosto, vamos escancarar as portas para as diferenças em uma programação com artistas que desestabilizam morais opressoras, afirmando seus corpos, identidades e escolhas.
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A monstruosidade é frequentemente associada ao desvio da norma e a um misto de formas que transgridem limites ditos naturais, produzindo certa desordem que assinala a diferença. O desconhecido. Na arte, é recorrente a ideia de monstruosidade como metáfora de uma paisagem sociopolítica, desestabilizando representações e identidades a partir do seu potencial de insurgência. No clássico “Frankenstein, ou o Prometeu Moderno”, da escritora Mary Shelley, ficamos diante da criatura forjada por Victor Frankenstein, um ser constituído pela amálgama de partes de outros corpos, que se compreende assustador, repulsivo e lamenta a sua solidão. Quem seria o monstro: criatura ou criador? O mundo que repele a diferença e produz violência ou o ser que é execrado em sua diferença?
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Os “freak shows” ou os “circos dos horrores” — de outrora e vigentes — exotizam e exploram corpos, práticas e existências considerados aberrantes, produzindo violências físicas, psíquicas e uma série de capacitismos.
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Dialogando com o pensamento de Paul B. Preciado e Michel Foucault, a ideia de monstruosidade revela-se ambivalente. Pode ser tanto um dispositivo de vigilância e controle que busca demarcar divisas entre indivíduos normais e anormais, humano e não-humano, entre outros binarismos, como um potencial de insubordinação performativa, por meio da força da autoafirmação da própria condição monstruosa.
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Na contemporaneidade, diversos artistas desafiam normas restritivas de gênero, raça e classe — esse monstro de três cabeças —, revelando o problema de categorizações que tentam assegurar um tipo de vida dominante e excludente. Tudo o que o antropologofalocentrismo ocidental forjou como o outro, a outra, só pode existir através da sua definição de monstruosidade. Qualquer coisa fora dessa reivindicação é aniquilamento e morte.
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No IC16, desejamos mobilizar uma dança com nossas próprias monstruosidades como recusa à violência imposta pela servidão à normalidade. Uma exigência ética e um convite para abrirmos espaço para outras formas e composições de vida.
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O IC16 traz “King Kong Fran” pela primeira vez a Salvador. Sucesso de público e crítica no Brasil, o solo é protagonizado pela personagem Fran, vivida pela atriz e palhaça Rafaela Azevedo, que convida o público a conhecer o avesso dos estereótipos do feminino. Um marco do humor de nosso tempo.
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A direção musical do espetáculo é assinada por Letrux, que se junta à programação do festival com seu terceiro disco solo, “Letrux como mulher girafa”, mais uma vez disposta a transpor padrões do mercado, da música e da sociedade. Juntas, essas mulheres têm pautado nas artes, na vida e nas redes sociais as violências de normas estigmatizantes, construindo liberdades.
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Os dois espetáculos vêm em dobradinhas no dia 24 de agosto: esgotaram suas primeiras sessões e abriram sessões extras. “King Kong Fran” já não tem mais ingressos. Letrux permanece à venda pela Sympla. Não perde.
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ASSISTA AQUI! Rafaela Azevedo e Letrux juntas no Conversa com Bial |
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21 de agosto | 19h | Na Casa Rosa | R$ 50 e R$ 25 | Classificação: 18 anos
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O espetáculo de abertura do IC16 é uma pré-estreia: “Monga”, da cearense Jéssica Teixeira, uma das artistas mais provocativas das artes cênicas brasileiras contemporâneas. A sinopse é em primeira pessoa: “Não tenho medo do meu corpo. Se eu tivesse, vocês ficariam mais à vontade? Se uma pessoa sente medo da outra, ela se torna uma pessoa capaz de fazer qualquer coisa com essa outra. De onde vem esse medo? Já pensou até onde isso pode levar?”.
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🎫 INGRESSOS ESGOTADOS!
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22 de agosto | 19h | No Teatro Gregório de Mattos | R$ 50 e R$ 25 | Classificação: 10 anos
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Alana Falcão e Ana Brandão, artistas da dança de Salvador, protagonizam “Cavalas”, que tem dramaturgia assinada por Lais Machado. A obra investiga a borda tênue entre semelhança e diferença a partir de práticas de improvisação e autoficção. Neste paradoxo, convivem o desejo de liberdade do animal e a disciplina da equitação. Uma brincadeira de meninas furiosas, que querem inventar-se a si mesmas, e cujo resultado pode ser um assombroso espelhamento.
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🎫 INGRESSOS ESGOTADOS!
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23 de agosto | 19h | Na Casa Preta Espaço de Cultura | R$ 50 e R$ 25 | Classificação: 12 anos
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Tieta Macau (MA/CE) chega com “Ancés”, em faz um percurso entre a presença e a ausência, em busca de ativar memórias não codificadas em instâncias dizíveis ou lineares. O espetáculo se desdobra em curvas e espirais, numa tentativa de traçar a genealogia de uma corpa negre que dança, que se desenterra, que tenta desfazer o trajeto feito e que questiona o trajeto imposto.
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🎫 INGRESSOS AQUI!
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24 de agosto | 15h | No Espaço Cultural Boca de Brasa Céu de Valéria | Gratuito | Classificação: 16 anos
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“Confabulações”, da baiana Cia Buffa de Teatro, tem dramaturgia e encenação de Joice Aglae. A montagem elege a bufonaria como linguagem para tratar sobre violências e imposições sofridas por mulheres. Quatro bufonas, representadas por Diana Ramos, Leila Kissia, Luíza Senna e Milena Pitombo, usam diferentes formas do riso, da alegoria e do grotesco para discutir a questão.
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🎫 ENTRADA GRATUITA!
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Para mais detalhes sobre a programação, acesse o site oficial |
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De quarta a sexta-feira, 21 a 23 de agosto, depois de assistir às peças, o público é convidado para um ponto de encontro com feras de Salvador, que apresentam performances e fazem a festa de cada noite. Com início às 20h30, o “COVIL” se instala no pub da Cervejaria ArtMalte (Rio Vermelho) e tem entrada gratuita.
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No dia 21 de agosto, RADIxCAOS corteja pelas ruas com a instalação-experiência “Elefante Branco”, uma performance onde o objeto é o próprio corpo encarnado em criatura. No som, Malayka SN multiplica possibilidades cênicas como DJ a partir da linguagem drag queen/queer: inclusão, diversidade e muita atitude na pista. A drag queen Milita Sattiva, também conhecida como “Realeza Macabra”, e DJ Latty, que mistura techno e ritmos eletrônicos com o funk produzido nas periferias do Brasil, fazem a dobradinha no dia 22 de agosto. No último dia de “Covil”, 23 de agosto, a multiartista, cantora, drag queen e DJ Karmaleoa comanda a cena e o “Monstraokê”: o tradicional karaokê com microfone aberto para cantoria e diversão monstras.
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Vem saber mais do COVIL! |
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A Residência Artística “Que Monstra Sou Eu?” vai mergulhar na pergunta-chave da curadoria do IC16. Com a condução de Felícia de Castro, Laís Machado e Larissa Lacerda, 10 pessoas selecionadas através de convocatória pública são convidadas a explorarem, através de estudos e exercícios cênicos, as múltiplas camadas de identidades, subjetividades e corporeidades que desafiam as normatividades socioculturais por meio de uma ética monstra.
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A proposta é uma fissura no espaço-tempo para que artistas possam coletivamente politizar suas feridas, dançar e criar a partir dos desvios, vulnerabilidades e espanto, “entre os cacos de uma vidraça estilhaçada”, como provoca Jota Mombaça. Qual o poder da sua monstra? Onde ela encontra força vital?
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A finalização da residência culminará no compartilhamento público coletivo, o “Demonster Day”, dentro da programação do festival.
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Saiba mais e veja lista de participantes |
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O IC Encontro de Artes conta com apoio plurianual do Edital de Eventos Culturais Calendarizados, realizado pelo Governo do Estado, através do Fundo de Cultura, Secretaria da Fazenda e Secretaria de Cultura da Bahia: um mecanismo fundamental para assegurar alguma estabilidade à realização desses eventos — a exemplo de mostras e festivais —, com natureza estruturante, no que diz respeito à formação de um calendário cultural, e estratégica, enquanto catalisadora de uma política pública.
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Cada festival de artes é um contexto agregador que possibilita a distribuição, o acesso e a sobrevida de expressões artísticas, o intercâmbio entre agentes artístico-culturais e demais pessoas cidadãs, a atualização de referências estéticas, dinamizando a economia e, principalmente, fortalecendo a cultura.
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Nesta seção em que a gente adentra nosso baú de produções, trazemos desta vez a pesquisa “IC Encontro de Artes: modos de gestão e produção”. Membro da Dimenti Produções Culturais e da Associação Conexões Criativas, realizadoras do IC Encontro de Artes, Ellen Mello, que responde pela coordenação geral e de produção do evento e é também integrante do seu núcleo curatorial, é a autora deste trabalho: sua dissertação de mestrado no Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da Universidade Federal da Bahia (UFBA), em 2020. Ela faz uma reflexão sobre o evento, pensando estratégias de sustentabilidade, diretrizes estéticas e curatoriais e seus contextos históricos – uma abordagem autoetnográfica, apontando projeções teórico-críticas respaldadas pelos campos dos Estudos Organizacionais e dos Estudos da Cultura.
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